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Capítulo Brasileiro da Internacional Association for the Study of Pain - IASP


Lembranças dolorosas


Lendo o texto escrito por Leandro Karnal no último domingo, 31 07 2016, em O Estado de São Paulo, intitulado “Lembrar e esquecer ou a vida entre Dory e Funes” me fez pensar sobre que a dor ao se cronificar também é um problema de memória, ou seja, o lembrar e o esquecer a dor. 

Sabe-se que a cronificação da dor envolve o conceito de que sua perpetuação decorre do fato de que o sintoma dor persiste mesmo que lesão inicial já tenha sido curada. Esse conceito nos permite pensar em quais seriam os motivos que levariam alguns indivíduos a desenvolverem dor crônica e outros não.

Alguns teóricos argumentam que haveria, em algumas pessoas, uma tal exposição cerebral onde estímulo doloroso ao persistir por mais de 90 dias em média induziria a alterações que os disporia à cronificação. Exames objetivos de Ressonância Magnética Funcional ou de SPECT ainda não apontam para a existência e alterações macroestruturais que suportem essa hipótese.  Nenhum sinal atividade objetiva cerebral em áreas relacionadas a dor tem mostrado consistente atividade que determine quais serão os indivíduos se desenvolveram dor. 

O que os exames objetivos têm mostrado é que áreas relacionadas a emoção e a motivação tornam-se mais ativadas, em alguns indivíduos, proporcionando aumento da atividade da memória, que talvez justifique afirmativa de que dor ao se cronificar é um problema de memória. Com isto se quer dizer que a dor crônica envolve um processo de aprendizagem de maneira degenerativa ou mudanças dos circuitaria mnêmica emocional. 

Lembrando da teoria de Pavlov, datada 100 anos atrás, em que revela que experiências decorrentes de aprendizagem, através de estímulos dolorosos, em animais, associam-se (aprendizado associativo) a outros eventos de maneira subliminar, como estímulos condicionados, incluídos aí o distresse associativa emocional. E, ocorreria da mesma forma, tanto na dor quanto numa emoção negativa, numa lembrança passada, ou da (re)vivência atual presente. 

A ideia é que o estímulo doloroso agudo, quando se prolonga, envolve padrões emocionais e  físicos que seriam co-ativados, contendo sinais que foram fixados na memória (por reforçamento positivos ou negativos) que, mesmo na ausência do estímulo doloroso, sestariam presentes. Ao serem revividos, ou relembrados, tanto de maneira mais consciente ou menos, envolveram diferentes aspectos da memória em suas diferentes formas, seja ela cognitiva/afetiva, ou de sensações e, portanto, inconscientes. 

Podemos ilustrar com ex. simples de nosso cotidiano, como quando uma criança se machuca e se dirige à mãe para afagá-la, beijando o machucado. A atitude denotaria o valor do afeto associado há um momento de dor e seu efeito sobre o alívio, pois o apoio afetivo traduz-se em encorajamento. Além de buscar o afeto da mãe a criança, busca a reafirmação que aquele momento pode ser suportado e enfrentado, mesmo que seja um momento muito ruim. A criança busca algo do tipo “Vai, meu filho, é difícil, mas sei que você consegue”, reassegurando que embora a situação seja difícil, alguém acredita que consiga suportar. O mesmo esquema poderia ser pensado acerca da associação negativa entre pensamento e emoção, quando, por exemplo, num episódio de violência alguém sofre um golpe físico e, além do golpe físico, associam-se momentos de angústia e emoção negativa magnificado essa memória. Tais flashes de memória parecem à vítima do golpe serem inesquecíveis, reverberando como que  infinitamente. Motivos neurobiológicos (hiperativação central) sustentam essa reverberação mnêmica, tais como em casos de transtorno de estresse pós-traumático. 

Em casos de dor crônica nossa hipótese é a de que haveria como que um colabamento de estímulos condicionados resultado num certo curto-circuito sináptico modificando o resultado, a resposta comportamental. 

Voltando ao exemplo da criança que busca mãe para ter suporte afetivo para suportar a dor, a hipótese metafórica seria a de que. esse “beijo” deixaria de ter uma conotação de afeto positivo, do apoio ao enfrentamento e encorajamento à busca de solução tornando-se extremamente negativo. Pois, a associação aversiva entre afeto negativo e conteúdo de memória ao serem relembrados, aqui não necessariamente conscientes, tornariam-se a reafirmação da incapacidade em enfrentar a difícil condição. Ou seja, confirmaria a impotência diante do estímulo devastador. 

Já a algum tempo estudiosos vem lançando a hipótese de que dor crônica envolve distorções de memória sejam elas sensoriais cognitivas ou afetivas ou elas em conjunto e a cada tempo novos estudos surgem nesta direção. 

Sugerimos, em especial, a leitura dos artigos das autoras Herta Flor e Elizabeth Loftus aos interessados. 


Fontes e Referências

Dra. Dirce Maria Navas Perissinotti – Diretora Administrativa da SBED (2016-2017)

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